domingo, 10 de julho de 2011

Arte das Interfaces

Comentário Crítico
As crescentes produções em Arte e Tecnologia em muito têm contribuído para o desenvolvimento de novas interfaces, mais intuitivas, inteligentes. Trabalhos de arte das interfaces há algum tempo corrigem um problema de concepção de interface, eliminando uma pretensa distinção entre o espaço atual e o espaço virtual tecnológico. São exemplos deste tipo de trabalho Bezerro de Ouro e Legible City, de Jeffrey Shaw; Liquid Views, de Monika Fleischmann, Wolfgang Strauss, Christian-Arved Bohn; Text Rain, de Camille Utterback & Romy Achituv, dentre outros.

No Brasil, Vestis, de Luisa Donati; Atrator Poético, do grupo SCIArts e Edson Zampronha; My Body, my blood, de Diana Domingues; Rara Avis de Eduardo Kac; Acaso 30, de Gilbertto Prado; Vozes, de Suzete Venturelli são apenas alguns exemplos de artistas que se preocupam com a arte das interfaces.

Aqui as interfaces são bicicletas, tapetes, telas sensível ao toque, peças do vestiuário, microfones, janelas... elas não são elementos específicos mas estão nos elementos, camufladas, escondidas. Podem ser acionadas de vários modos, seja batendo palmas, soprando, caminhando ou simplesmente pensando. Os sistemas não não visíveis, as interfaces são mídias, pura comunicação.

Para Röller e Zielinsky (2001), na medida em que a arte tende para uma arte das mídias, ela se transforma em arte das interfaces. Da mesma forma a teoria da arte, ao tender para uma história das mídias, ela se transforma em uma teorias das interfaces (apud ARAÚJO, 2005, 181).

As interfaces caminham fisicamente para assumirem formas de outros objetos, ou simplesmente se fazer passar por vários objetos, em atitudes próximas da naturais, como o joystick do game Wii, da Nitendo, que pode ser acionado de vários modos, simulando o funcionamento do objeto que ele substitui. Esconder-se ou camuflar-se são dois caminhos bem claros para os elementos físicos da interface.

Os elementos gráficos do mesmo modo estão sendo substituídos, sendo comuns sua utilização em projeções interativas, com reconhecimento do gesto para deslocamento ou manipulação da informação, como é o caso das interfaces gráficas de Op_era, de Daniela Kutschat e Rejane Cantoni.

Mais que invisíveis e de fácil interação, as interfaces assumem a direção proposta por vários pesquisadores, inclusive tornando-se “do tipo neurológicas” (KISSELEVA, 1998, 307). Os sistemas tornam-se “vivos” ou com capacidade de processamento cognitivo, usando de todas as interfaces para cumprir suas prerrogativas de realização da tarefa.

A interface computacional contemporânea está em um processo de grande transformação, tendo na arte o seu carro chefe. A profícua contribuição da arte para o desenvolvimento da interface faz dela peça chave para compreender o futuro da interface, em seus modos de aparecimento ou desaparecimento. As dimensões da interação estão atreladas às conquistas e inovações trazidas pela arte das interfaces, gravadas indelevelmente na cultura contemporânea.

Histórico e contexto atual do conceito
Historicamente, as interfaces já tiveram várias formas, assumindo-se como física, gráfica e cognitiva, esta última conhecida como natural ou inteligente.

Inteface de usuário, ponto de contato para o intercâmbio entre humanos e máquinas, pode assumir muitas formas. É na interface, a ser usada pelo observador ativo de acordo com a regras do mundo particular de ilusão, que as estruturas de simulação projetadas para comunicação encontram-se com os sentidos humanos. (GRAU, 2007, 220)

De acordo com ROCHA (2003, 10), orientadas por Nielsen, em 1945 as interfaces eram apenas físicas, sendo apresentadas como cabos, chaves ou botões de acionamentos – o modelo não executava ações somente físicas, mas lógicas a partir dos acionamentos, com tecnologia de hardware baseada na mecânica e eletromecânica, e uso somente para cálculos. Não havia ainda interface de usuário. Nos 10 anos que se seguiram os hardwares eram válvulas e máquinas enormes com alta taxa de erro, com interfaces baseadas em programação, e batch; mas já se usava a linguagem de máquina 0011. Entre 1955 e 1965 os transistores passaram a ser usados, e os computadores começam a ser usados fora de laboratórios. As interfaces eram baseadas em linguagem de comando. Entre 1965 e 1980 os menus hierárquicos e preenchimento de formulários já dominavam as interfaces gráficas, com hardwares baseados em circuitos integrados. Entre 1980 e 1995 chegam as interfaces criadas por Engelbart e Kay, utilizando WIMP (Windows, Icons, Menus e Point devices). Os hardwares já eram computadores pessoais. A partir de 1995 há integração de hardwares, com o surgimento de interfaces inteligentes, tidas como naturais.

Com as interfaces gráficas, houve uma junção dos elementos físicos e gráficos, em atuação conjunta. Mouse e teclado são as interfaces físicas mais usuais nos dias de hoje, e trabalham em conjunto com a interface gráfica, tudo o que é visto na tela do computador. A replicação dos elementos encontra sentido no conceito de duplo virtual, também de Engelbart, segundo o qual os elementos físicos podem ter suas representações – ou duplo virtual – nas interfaces gráficas, como ocorre com o mouse e seu duplo, o cursor. Os avatares são exemplos de duplo virtual do usuário. Os aparelhos celulares também assumem este modo de integração, trabalhando com o visor - interface gráfica - e o teclado - interface física.

Atualmente as interfaces produzidas seguem o ideal de seu surgimento: tornar-se invisível. Quando Engelbart criou a interface gráfica, ele adicionou um elemento ao sistema, a própria interface gráfica, criando uma experiência manipulação direta da informação pelo usuário. Até então a linguagem de comando era a única utilizada, e era baseada em ordens para o sistema realizar tarefas. Com a inserção da modalidade gráfica o usuário passou a, ele mesmo, deslocar informações de um ponto a outro da tela, conduzir arquivos para outros locais, até mesmo para a lixeira, simulando o ato de deletar a informação. Apesar de ter havido a inserção do elemento gráfico, a experiência foi de manipulação direta; a interface gerou uma idéia de inexistência de distância entre usuário e informação, usuário e sistema. O usuário não via mais o computador ou o sistema, somente a tarefa a ser realizada. Atualmente as interfaces se distanciam do formato gráfico já tradicional, buscando sua realização, e também a do usuário:

The real problem with the interface is that it is an interface. Interfaces get in the way. I don't want to focus my energies on an interface. I want to focus on the job. . . . An interface is an obstacle: it stands between a person and the system being used. . . . If I were to have my way, we would not see computer interfaces. In fact, we would not see computers: both the interface and the computer would be invisible, subservient to the task the person was attempting to accomplish. (NORMAM, 1999, 219)

Não querendo ser vistas, as interfaces se escondem nos ambientes, roupas, em dispositivos outros, e tornam-se mais inteligentes, desenvolvem capacidade “cognitiva” de processamento. São baseadas em sensores e outros elementos físicos e graças a computação pervasiva estão em todos os espaços, atentas para entrarem em ação, ou fazer os sistemas entrarem em ação. Ainda assim as interfaces possuem seus elementos físicos e, algumas vezes, os elementos gráficos.

A inserção de sensores e de recursos outros da computação pervasiva faz a interface alcançar o status de interface cognitiva, também chamada de interface natural (KISSILEVA, 1998; GRAU, 2007) e interface inteligente (NORNAM, 1990). Neste sentido, discutir sobre um novo tipo de interface é tarefa não apenas premente, mas essencial para o desenvolvimento do campo da comunicação homem/máquina. A nova interface considera elementos gráficos, físicos e/ou cognitivos, muitas vezes tornando-se invisível – ou camuflada, escondida -, possibilitando que os usuários concentrem suas energias na execução da tarefa, e não na compreensão da interface ou do sistema.